A terapeuta informou que vai sair do hospital porque tá um rolo a agenda por lá. Aumentou muito a demanda da Psicologia. Hordas de crianças com dislexia , déficit de atenção, transtornos de comportamento , hiper-ativos , depressão severa e leve. Olhei pela janela do consultório e suspirei. Criança é tão espontânea e fácil , pensei.
Mas hoje em dia não, todas estão maluquinhas, como menino do Ziraldo.
E eu, falando do medo de magias, vidas passadas, fantasmas e falta de libido.
Broxei legal .Só fico excitada com arte. Com gente tenho problemas...risos.
Por isso que estou lá , sentada na frente dela, falando do sexo dos anjos. Ela não pode me dar um rótulo. Que tipo de transtorno eu tenho ? Será que é válido ficar toda a semana em frente dela repetindo as mesmas coisas ? Bom, comigo não tem repetição, cada semana é uma novidade. Uma semana é sexo. Na outra, morte. Na seguinte é status e trabalho.
Na outra digo que estou de mudança prá outra cidade. Uma autêntica cigana.
Uma vez disse em alto e bom som que tenho orgulho de conviver comigo mesma....rs.
Woody Allen, please. Ele faz diálogos melhores que os meus.
Vivo minha vida tão à margem de tudo, por isso adoro aglomerações.
Por que sei que não me encaixo em nada. Saio ilesa.
Acho que me daria muito bem no submundo da Máfia.
Uma cidadã que pratica um crime diário, e ninguém fica sabendo !
Já dei a volta ao mundo , cruzei o Estreito de Magalhães e cheguei a Calicute.
O sultão me recebeu com honras de chefe de estado.
Mas , apesar de toda a fúria e rudeza,
sei que tenho um coração de musse de maracujá.
Joguei fora essa minha mania de acreditar em coisas que não consigo ver.
Tenho letra de calígrafo, sigo esse roteiro aqui da mão que vejo espalmada.
Vou do Olimpo ao Hades em segundos.
Escrevo como vivo, querida terapeuta.


* Woody Allen, 1996

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| Por Prensada | quinta-feira, 13 de novembro de 2008 | 12:51.